presidente da Federação Paulista de Futebol, Reinaldo Carneiro Bastos, falou pela primeira vez sobre a interminável final do Campeonato Paulista, vencida nos pênaltis pelo Corinthians e marcada pela reclamação do Palmeiras com a arbitragem.
O dirigente revelou que uma investigação feita pela entidade deixou claro que não houve interferência externa na decisão de anular um pênalti marcado para o Palmeiras, no segundo tempo da partida disputada no dia 8 de abril.
Marcelo Aparecido Ribeiro de Souza marcou falta de Ralf em Dudu, dentro da área, mas voltou atrás após intervenção do quarto árbitro Adriano de Assis Miranda. Indignado, o presidente do Palmeiras Maurício Galiotte disse que houve, sim, interferência externa, e chamou o torneio de "Paulistinha".
O clube foi além. Contratou a Kroll, uma megaempresa de investigação para tentar provar irregularidades na final, e pediu a impugnação do jogo no TJD-SP. Sem êxito no tribunal paulista, entrou na última quarta-feira com uma representação do STJD.
Reinaldo Carneiro Bastos concede entrevista em sua sala na FPF (Foto: GloboEsporte.com)
Reinaldo Carneiro Bastos, que recebeu a reportagem do GloboEsporte.com em sua sala na FPF, admitiu equívocos no processo, disse que espera retomar a relação pessoal com Galiotte e se declarou favorável ao árbitro de vídeo na próxima edição do Paulista, mas deixou claro que essa decisão depende de vários fatores e será tomada pelos clubes.
GloboEsporte.com – Depois de toda essa investigação, a que conclusão a FPF chegou sobre o caso?
Reinaldo Carneiro Bastos – Chegamos à conclusão de que não é "Paulistinha", é um Paulistão. Os números mostram: recorde de audiência, números de bilheteria e público do campeão são os maiores. O interesse e a luta de todos os clubes para chegarem à final. Fica claro que é um Paulistão.
A Federação conduziu o caso da maneira correta, diante da reclamação do Palmeiras?
– Nós conduzimos da forma que tínhamos de conduzir. O Palmeiras se dirigiu à Justiça Desportiva, tem legitimidade para defender e procurar seus direitos. Na Federação, não recebemos nada formal da Sociedade Esportiva Palmeiras. Nenhum ofício. Imediatamente, abrimos uma sindicância interna para analisar com independência e critérios rígidos tudo que aconteceu a partir do pênalti.
O que essa sindicância descobriu?
– Ela viu os telefonemas de cada um, os celulares de todos os envolvidos, um trabalho segundo a segundo de todas as imagens disponíveis. Sabemos que imagens são editadas, tanto as do Palmeiras como as dos canais de televisão, mas seguimos tudo que ficou disponível e ficou claro que não houve interferência externa.
O senhor detectou algum equívoco em algum gesto ou processo, e que não pode se repetir?
– Sim, há recomendações para que se tomem providências. Tenho alguma experiência no futebol, no meu íntimo eu já sabia que tínhamos de corrigir fatos. Todas as pessoas que estavam lá (no gramado) poderiam estar, mas não vale a pena estar. As pessoas tomaram alguns procedimentos para ajudar, por exemplo, a Sociedade Esportiva Palmeiras no caso do helicóptero (que estava sobrevoando o estádio). Uma das pessoas da Federação que estavam lá é da FAB (Força Aérea Brasileira), fala com gente do alto escalão, e estava pedindo providências por solicitação do Palmeiras. O sinal lá embaixo é ruim, ele foi ler a resposta dentro do gramado. Temos a resposta dele no WhatsApp e o agradecimento do Palmeiras pela atitude dele. Identificamos claramente o que estava acontecendo com a única pessoa que estava com celular naquele momento (aqui, Bastos fala de Marcio Verri Brandão, flagrado ao telefone, no gramado, no momento em que o pênalti é marcado).
Neste print do celular de Verri, ele tenta falar com um capitão durante a partida (Foto: Reprodução)
Sem sucesso, Verri aciona um coronel para tratar do helicóptero (Foto: Reprodução)
– Outra correção que precisamos fazer é sermos claros sobre quem está autorizado a estar no gramado. Seremos muito mais rígidos nessa questão, estará na escala do jogo a função de quem pode estar lá dentro. Já fizemos na final da Série A3, entre Atibaia e Portuguesa Santista. Temos que aprender que um árbitro resolve em dois minutos e cinquenta segundos, aproximadamente, que um pênalti inexistente não deveria ter sido marcado, e leva mais cinco minutos para fazer a bola rolar. Isso é uma falha de procedimento. Temos assuntos internos a serem resolvidos, mas concluímos que temos um grupo de pessoas corretas trabalhando na Federação Paulista de Futebol. O que me entristeceu foi ver profissionais que lutaram tanto para fazer um campeonato perfeito, por um acidente de percurso, por algumas falhas, não conseguirem sorrir no dia seguinte. Não aceitamos qualquer questionamento sobre o caráter, a honra e a honestidade das pessoas.
Essa comunicação entre o Verri e o Palmeiras aconteceu durante o jogo? O fato de ele ser da diretoria de arbitragem não causa estranhamento?
– Durante o jogo e houve um agradecimento do Palmeiras no dia seguinte, mesmo depois de toda aquela confusão. Vou explicar porque ele estava no estádio. Ele e o Mário Sérgio, que é da comissão de segurança. Nas semifinais e finais começamos a notar um descontrole de atletas e comissões técnicas no túnel de acesso aos vestiários. Resolvemos interferir de maneira mais drástica. São dois clubes muito grandes e os funcionários estavam brigando. Essas pessoas, experientes nessa área, estavam lá para tomar conta e evitar problemas. E por que ele (Verri) saiu? Por esse problema que contei, para conseguir receber o WhatsApp do comandante e tirar o helicóptero solicitado pelo Palmeiras, que agradeceu no dia seguinte.
Agradecimento "em nome do Palmeiras", no início da tarde de segunda-feira, dia seguinte ao jogo (Foto: Reprodução)
Quantas pessoas e telefones celulares foram analisados?
– Todos que estavam no gramado, do grupo de arbitragem. Árbitro não tem como levar celular, então é o Marcio Verri Brandão, o Dionísio (Roberto Domingos, diretor de arbitragem), o Agnaldo (Vieira, delegado da partida). Todos que poderiam estar com celular.
E pela apuração de vocês, é possível concluir que essas pessoas não interferiram na escolha do árbitro de voltar atrás?
– Exatamente. Não se comunicaram com ninguém. Não há nada que comprove essa interferência. A comunicação normal entre a equipe de arbitragem ocorreu, e é recomendada.
O que pode acontecer, na prática, com esse rompimento entre Palmeiras e FPF?
– Não tivemos nenhum contato oficial, não recebemos nenhum ofício da Sociedade Esportiva Palmeiras, sobre nenhum assunto. Na emoção, falamos mais do que devemos. O assunto tem que ser esgotado com tranquilidade. O Palmeiras é um clube muito importante para o futebol de São Paulo, o futebol brasileiro. É um clube muito ativo aqui na Federação, estava sempre presente nas reuniões com executivos, coordenadores de base, atletas, capitães, jurídico, marketing, comunicação. Sentimos falta porque era um clube que contribuía para melhorarmos o futebol. Confiamos no bom senso das pessoas. As entidades, Sociedade Esportiva Palmeiras e Federação Paulista de Futebol, em algum momento voltarão a conviver. Eu não sou eterno aqui, o Mauricio (Galiotte, presidente do Palmeiras) não é eterno lá. Pessoalmente, sinto falta da relação com o amigo Mauricio. Trocávamos confidências, ideias, sugestões, resolvíamos problemas, ele tem o feeling do clube grande. Era uma pessoa importante na minha relação pessoal, e essa se perdeu.
O senhor pretende ir atrás do Palmeiras?
– Em todos os eventos que for necessária a presença do Palmeiras, eles serão convidados, sem nenhuma dúvida. Não há nenhuma mudança de comportamento por parte da Federação. Na relação pessoal, farei um esforço para que retome. Estamos num momento difícil, mas espero que consigamos nos entender.
Logo no início da entrevista o senhor respondeu ao "Paulistinha" citado pelo presidente do Palmeiras. As declarações dele incomodaram?
– Logo depois do jogo eu entendi. O presidente é o torcedor número um do clube. Estava pressionado, precisava muito ganhar esse Paulista, faz muito tempo que não ganha (o último título estadual do Palmeiras foi em 2008). Eles tinham certeza que seriam campeões, fizeram um excelente resultado na Arena Corinthians, tinham muita convicção. Quando marcam o pênalti inexistente e o lance se torna um tiro de canto, isso criou um trauma. A partida continuou, fomos para os pênaltis e o Palmeiras seria campeão se não perdesse dois pênaltis. Não foi o pênalti não marcado que definiu o título. Aquele desabafo dele, naquele momento, eu até entendi. Continuar eu acho um exagero. Ninguém luta por um "Paulistinha" do jeito que o Palmeiras lutou durante e depois da competição. Não é "Paulistinha", é Paulistão.
Antes da polêmica, Bastos, Galiotte e Andrés Sanchez, presidente do Corinthians, posam com a taça do Paulista (Foto: Felipe Zito)
O que o senhor pensa a respeito do VAR?
– Eu, pessoalmente, sou a favor do VAR. Mas digo aos senhores que não chegou à Federação, de nenhum clube e nem da Sociedade Esportiva Palmeiras, nenhuma solicitação para termos o VAR no Campeonato Paulista. É um assunto que analisamos internamente, mas a Fifa acabou de definir a regra do jogo. Entendíamos que não era momento de começar antes de conhecer a regra, com um investimento alto. Essa competição é feita pelos clubes, nós administramos o que ficou decidido com eles, treinadores, atletas, comunicação, marketing, jurídico. Estamos começando a fazer cotações e chamar empresas para estudar a possibilidade do VAR. Vamos apresentar um projeto e será uma decisão dos clubes. Temos que montar um treinamento grande, apresentar quantas partidas serão feitas, quantos profissionais têm que ser treinados. É complexo. A Copa do Mundo será um aprendizado para todos, teremos um caminho mais seguro. Para ter árbitro de vídeo, tem que ser muito profissionalmente, exaustivamente treinado e com uma empresa de alta competência.
E quem vai pagar?
– Vamos encontrar uma forma, garanto que o clube não vai pagar sozinho, mas tudo tem limite. Vamos mostrar a forma de fazer, quanto custa, e vamos decidir com os clubes de onde sairá o dinheiro porque eles têm uma receita aqui dentro. O contrato que assinaram de publicidade estática, com emissoras de televisão, é um bolo que você pode investir no VAR.
No Brasileirão os clubes não quiseram pagar, e em São Paulo temos quatro clubes com um poderio financeiro muito superior ao dos outros.
– Não foi esse o problema na CBF. Não havia um valor definido, poderia variar de 40 a 60 mil reais por jogo. Não havia um plano de treinamento e estavam a 70, 80 dias da competição. Não se decide pelo VAR dois ou três meses antes. É impossível ter sucesso sem treinamento exaustivo, sem trabalhar com gente experiente e sem ter escolhido a empresa vencedora. Não foi só dinheiro, foi insegurança.
E como se pode testar o VAR antes do Paulista do ano que vem? Na Copinha?
– A Copinha seria a última etapa disso. Se aprovarmos, vamos usar na Copinha. Enquanto isso, para eliminarmos custos, temos que fazer em jogos seguidos num mesmo estádio, do Nacional, por exemplo, para o equipamento ficar sempre ali, e treinar as pessoas. Isso leva de quatro a seis meses. Não são todos que têm aptidão para ser árbitro de vídeo.
O senhor pensa em uma central única, como em Moscou, na Copa, ou é melhor ter uma unidade em cada estádio?
– Pelo que temos notado, depende muito da área de wi-fi, da ligação de mídia. No Brasil, pelas informações que temos, não há como fazer uma central única. VAR é risco zero. Você não pode contar para o clube que caiu o wi-fi.
A ideia é implantar no campeonato inteiro?
– Vamos apresentar duas possibilidades aos clubes: nos 110 jogos ou nas oitavas, quartas, semifinais e finais. Ou faz a competição inteira ou a parte que mais importa. O dinheiro é dos clubes, temos que respeitar a opinião deles. Vamos municia-los de informações e ouvi-los.
(Foto: Infografia)
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